A rua desconhecida

Acordo a pensar na galeria, aquela que gostaria de visitar. Fica longe.

A nossa Lisboa de ruas estreitas, com curvas e por vezes rebuscada, faz-me pensar se hoje é o dia para esta galeria.

Não penso mais nisso. Agarro-me à intuição e viajo com o gps do deixa a vida me levar. Numa viagem de autocarro percebo que neste dia solarengo de inverno, onde o sol aparece escancarado na janela, vários são os lugares onde passar.

Nunca aqui estive. Neste lugar verdejante, os jovens namoram, os idosos conversam, os cães brincam, o sol atravessa as árvores, os comboios galopantes passam e os carros no movimento do para/arranca são vistos através das grades deste jardim na cidade. As árvores deste jardim, de imponência relevante, estendem-se ao longo da fachada que compõe este cenário. A primeira foto é feita. Nesta caminhada de aventura, onde a câmera fotográfica é o Óscar de Hollywood, continuamos pelos caminhos deste Bairro de Santos.

Aventuro-me numa rua desconhecida. Aqui é o bairro. Aqui é o coração da cidade. Aqui vive-se em comunidade. Aqui se vê crianças pelas ruas. Aqui contínuo na esperança de saber onde fica o final desta rua, para mim desconhecida. Contínuo por ela tão simples e autêntica. Ouço o som típico do eléctrico que assobia aos carros que por ali se encontram. Posiciono-me de forma a captar este momento nesta rua de estilos. Tento captar a conjugação da luz de hora dourada com o movimento congelado do nosso amarelinho. O click entoa, o eléctrico apita, a fotografia surge.

Continuo nesta rua de Lisboa. Mais à frente, quase a chegar ao final da rua, avisto uma subida íngreme digna de uma colina Lisboeta. Não poderia acreditar, como seria possível esta rua, pela qual me tinha aventurado, chegar a tão central avenida. Por sincronia da inevitabilidade, percebo que estou a poucos minutos da tal galeria que ao acordar senti que queria visitar. Esta é a surpresa provocada pelos labirintos da cidade. A qualquer momento, aquilo que nos parecia longínquo torna-se perto, aquilo que gostaríamos de ver, está mesmo aqui ao lado. Contente com o inesperado, não subo a colina e volto para trás nestas estreitas ruelas. Em frente sigo, numa caminhada para o que pensei não encontrar nesse dia.

Olho à minha volta e quase a chegar à Galeria encontro, do lado direito da rua, uma outra bonita avenida. Olho para cima e vejo um edifício pintado com as cores de Marrocos. A roupa estendida, de cores que exaltam um arco-íris ali bordado é de uma família de origens longínquas. As cores transportam-me para outros países e a roupa estendida faz-me perceber com detalhe uma grande família . Fotografo tendo em conta vários ângulos, várias composições e perspectivas. Tento fazer daquela janela, o modelo, que de versatilidade feroz se mostra ao ritmo da objectiva. Divirto-me a ver e a olhar só para ela, esta janela.

Continuo e ainda na mesma rua um pouco mais à frente, avisto uma entrada criativa para um recanto que simula um pátio. Vejo-me a descobrir um museu, tímido, de portas abertas para a arte. O edifício estilizado por bonitos azulejos faz-nos crer que alguém ali deixou muita cultura para partilhar. O tempo urge. Falo com as pessoas responsáveis por este lugar, que com grande entusiasmo me convidam a ficar ou até aqui a voltar. As surpresas, nestas ruas que nos convidam a entrar são sempre presentes que nunca esperamos encontrar.

A Galeria. Finalmente e após um longo caminho de descobertas, aventuras e surpresas aqui cheguei. Neste dia que começou por aqui querer chegar, percebi que o caminho é aquele que é feito pelo coração. Que por vezes a vida nos leva no seu percurso sem que nos demos conta que aquilo que mais desejamos mais cedo ou mais tarde acaba por acontecer, assim como eu, que cheguei à Galeria que tanto queria visitar.

Texto escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico

Locais presentes no artigo:

Galeria_ Apaixonarte

Jardim_ Jardim Nuno Alves

Rua_dos Poços Negros

Museu_Júlio Pomar

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