A mulher que olha a lua

É um dia especial, a atenção está toda focada nos céus. Ela, como sempre, é a estrela maior das constelações brilhantes que iluminam Lisboa.

Saio de casa com as minhas melhores amigas – a câmera, mestre da visão e a bicicleta, rainha da liberdade. Sigo o mesmo percurso que faço aquando dos bonitos passeios pelo rio. Passo com velocidade pelos Jardins de Belém, lugar cheio de cheiros a árvores húmidas que foram regadas recentemente, cruzado por calçadas de história, cheio de gente do mundo com os Pastéis de Belém em fila. Belém é movimentado e em dias como os de hoje, onde a lua é o foco de todas as objectivas, a azáfama ainda é maior.

Sigo até ao Mosteiro dos Jerónimos, imponente monumento lisboeta onde tento captar o beijo de dois namorados. Não consigo. Continuo o caminho. Atravesso o túnel. Subo e vejo-me de frente para o rio, numa roda dos ventos com 50 metros de diâmetro onde o mundo é o seu centro, ou não fossem os descobrimentos portugueses o nosso maior tempo áureo.

Junto ao rio, admiro as pessoas que ali passam. Vejo os barcos que se movimentam nas leves ondas do nosso Tejo. Olho a lua, cheia, com um brilho como se fosse o candeeiro do rio e assumindo-se como a personagem principal deste enquadramento nocturno que pretendo fotografar.

Paro a bicicleta junto à margem. Uma vasta linha de fotógrafos acompanha-me neste momento que é o eclipse lunar. O entusiasmo de todos é notório. Por entre Iso’s, tripés e muitas composições fala-se de viagens, de fotografia, de histórias, da lua. Ela brilha. Tentei por várias vezes enquadrá-la. Tentei captar a sua melhor luminosidade. A câmera, a minha melhor amiga, não tinha a lente necessária para mostrar a lua que estava aos meus olhos. Mostrava apenas uma lua que não era fiel à realidade. Fiquei frustrada com o resultado desta lua que não consegui captar. Em fotografia, o segredo passa por continuar a olhar, até o universo nos piscar o olho e num clique eternizarmos esse momento.

O passeio continua junto ao rio. Antes de chegar ao Maat, sinto uma incrível energia de paz e silêncio. Este museu, de arquitectura moderna, com escadas que seguem até ao rio e curvas pronunciadas encontra-se cheio de gente. Gente que olha para a lua. Com tanta gente neste lugar icónico da cidade, sente-se apenas o som ensurdecedor das ondas do Tejo. Foi nesse momento que decidi não fotografar a lua mas sim as pessoas que olham para ela. Decisão difícil esta onde por todos os jornais a lua assume-se como o galardão de ouro da primeira página. Acredito que em fotografia o menos óbvio é aquilo que nos faz ter uma história para contar. Lá estava ela, a minha história, a musa com que me inspirei, uma pessoa desconhecida que nesse instante de contemplação olha a lua com a maior das profundidades. Ela é a mulher que olha a lua e que eu fotografei.

Locais presentes no artigo:

Monumento_Mosteiro dos Jerónimos

Doces Tradicionais_ Pastéis de Belém

Museu_Maat


Texto escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico

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